segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Não está fácil pra ninguém

Quem é jornalista sabe que o lado glamuroso da profissão, disseminado em filmes hollywoodianos existe, na prática, para poucos (pouquíssimos). O STF decide que não é preciso diploma pra exercer a profissão, os sindicatos não operam como o esperado, a classe é desunida e os rumos são incertos. Muitos se viram em dois empregos para dar conta das contas, principalmente quando se trabalha em redação (assessorias de imprensa em geral exigem menos trabalho aos fins de semana e feriados e pagam melhor). Mas a queixa, meus caros, nao é exclusividade dos redatores brasileiros. Os Brüders alemães também querem melhores salários, e pra isso fizeram uma petição online voltada aos donos de jornais. Segue a petição traduzida.

*O termo editor é utilizado por eles para se referir aos donos dos jornais.



"Queridos editores de jornais da Alemanha,

nós somos os jovens jornalistas da Alemanha. Já devem ter ouvido falar de nós alguma vez. Vocês estão prestes a decidir o nosso futuro. Com um salário baixo, vocês querem acabar com nossas perspectivas profissionais. Mesmo quando vocês dizem que não, vocês acabam colocando em risco também o futuro do próprio jornalismo.

Jornalismo já é, para muitos, uma profissão pouco atrativa. Ainda nas universidades e escolas de jornalismo os jovens jornalistas já descobrem como se tornaram ruins as oportunidades de trabalho no campo das mídias. Muitos de nós vimos amigos desistirem do jornalismo. Eles acabam preferindo se tornar relações públicas ou procuram outros empregos com melhores perspectivas de futuro. O ramo terá em breve problemas para conseguir contratar bons profissionais.

Caros editores, vocês de fato sabem que estão prestes a desencorajar do jornalismo muitos bons profissionais, com seus honorários e suas políticas salariais? Quem vai querer trabalhar pra vocês, se vocês encurtarem mais uma vez os salários drasticamente? Com todo o respeito: nós acreditamos que a atual geração de jovens jornalistas recém formados nas universidades e escolas de jornalismo são os melhores e mais bem preparados que a Alemanha já teve.

Muitos de nós trabalhamos com determinação há anos como repórter ou redatores. Nós fizemos estágios mal remunerados em suas empresas e trabalhamos por anos recebendo o limite do sustentável. Nós estudamos, aprofundamos nossos conhecimentos em política, ciência e cultura, temos experiência no exterior, falamos diversas línguas. Podemos escrever, filmar, conhecemos as tecnologias da web 2.0. Temos que trabalhar nos finais de semana, à noite, conhecer sérios problemas sociais de perto e fazer hora extra, pelas quais nós naturalmente nunca somos pagos. E agora o salário inicial para jovens jornalistas ainda deve diminuir em 30%?

Nós somos idealistas. Nós amamos essa profissão. E nós acreditamos que a mídia tem um papel importante na democracia. Mas sabe? Se vocês diminuírem o salário de maneira tão drástica, vocês nos darão a sensação de que não acreditam mais no jornalismo. Nos dá a impressão de que jornais são para vocês apenas um objeto de especulação, que deve render o maior lucro possível até o grande colapso final desse modelo de negócio.

Mas o jornalismo tem uma tarefa. O que seria do quarto poder? Quem separaria para os leitores o importante do desimportante, quem ordenaria e explicaria para os leitores as importantes conquistas e descobertas sociais?

Vocês adoram falar de jornalismo de qualidade. Para ter qualidade, é preciso ter jornalistas motivados. Leitores compram produtos midiáticos, porque esperam ler ali notícias e histórias bem pesquisadas e apuradas. Nós acreditamos no futuro do jornalismo profissional.

Caros editores, como podem falar em mercado, quando vocês ao mesmo tempo cortam verbas das redações, acabam com empregos e diminuem o nível de salários? Uma empresa não deveria investir em um negócio no qual ela acredita? Seleção, análise, classificação e conhecimento em áreas específicas, esses são os pontos fortes do jornalismo de qualidade. São fatores de qualidade que exigem tempo e trabalho intensivo. E é exatamente isso que vai faltar no jornalismo barato.


Nós agradecemos pelos colegas de vários jornais, que fizeram notável nas últimas semanas, que suas crenças no futuro do jornalismo ainda existem. Com seus chamados e suas greves, também se preocuparam com nosso futuro.

Caros editores, mostrem que vocês também acreditam nos jovens jornalistas e no futuro do jornalismo. Nós os incentivamos a descartar os novos planos de mudança. Quem quer bons jovens, deve pagar um salário justo e apropriado. É isso que nós esperamos.

Munique, 2 de julho de 2011."


O salário acertado entre donos de jornais e a associação de jornalistas da Alemanha para iniciantes na carreira era de 1.558 euros até o ano passado, mas a realidade é outra. Normalmente é oferecido a eles nao mais do que 1000€ (o equivalente a cerca de R$ 2.240), e na maioria das vezes benefícios como seguro de saúde não são inclusos. Ainda assim, a previsão é de que os salários possam ser diminuídos em até mais do que 30%, que foi a quantia proposta pela Bundesverband der Zeitungsverleger (Associação Nacional dos Donos de Jornais da Alemanha)
Aqui no Brasil, muitos jornalistas, iniciantes ou não, sonham com um salário de R$ 2.240 e por isso o choro dos alemães nos parece exagero. Mas é preciso levar em conta o custo de vida, que nas grandes cidades alemãs, como Munique e Berlin, é alto. A negociação entre a Deutscher Jornalisten – Verband (Associação dos Jornalistas Alemães) e a Bundesverband der Zeitungsverleger (Associação Nacional dos Donos de Jornais) ainda não foi finalizada.




Com informações do site da Associação dos Jornalistas Alemães (DJV) http://www.djv.de/SingleNews.20+M5a4036139e5.0.html

O original da petição em alemão está disponível no link http://www.openpetition.de/petition/online/offener-brief-von-nachwuchsjournalisten-an-die-deutschen-zeitungsverleger


Tradução minha, Ana Carolina Castro.