terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Ressaca pós intercâmbio

Já me pediram uma vez pra escrever aqui sobre a sensação de voltar pra casa depois de um intercâmbio como o que eu fiz, longo, de um ano. Eu sempre quis escrever, e ao mesmo tempo, tive medo. É como se, caso eu escrevesse a respeito, estivesse assumindo o fato de que acabou. E, no meu caso, foi tão, mas tão incrivelmente bom, que mesmo estando de volta há quase 5 meses, eu ainda não gosto muito de pensar que acabou mesmo.
Aí chega o fim do ano, e eu vou começar a dizer pras pessoas interessadas "voltei do intercâmbio ano passado..." E daí? É a lei natural das coisas, o tempo passa, acontecimentos marcantes vão ficando cada vez mais distantes naquele departamento da vida que gostamos de chamar de passado. Ok, eu sei disso. Mas de certa forma, parece que falar "voltei do intercâmbio esse ano" soa tão melhor!!
O fato é: voltar de um intercâmbio bem sucedido tem sido, pra mim, um exercício doloroso e lento de desapego.
No início, me joguei de cara no Trabalho de Conclusão de Curso, que serviu pra me distrair da ideia de refletir a respeito. Aí quando o trabalho foi entregue e apresentado, e eu já não tinha muito com o que me distrair, tive uma crise horrorosa, do tipo "caiu a ficha" e chorei um fim de semana inteiro.
Outro motivo que eu não queria escrever sobre isso, além do medo de assumir pra mim mesma que acabou, é que eu sei que soaria como um monstrinho. E é meio inevitável, pelo menos no meu caso.
É claro que houve choro quando fui embora, e depois veio a saudade, e em momentos mais cruciais, como quando sofri o acidente lá, ou quando o meu irmão sofreu um acidente aqui, eu quis voltar. Mas sendo bem sincera: eu me adaptei muito fácil por lá. Dei sorte de ter pessoas maravilhosas morando comigo, nos dois semestres e nas duas casas em que morei. Me adaptei super bem à vida naquela cidadezinha de bonecas, colorida, pequena e no meio de um parque ecológico. Me acostumei a ir a pé pra todos os lugares, ou, no máximo, pegar um ônibus pontual ou um trem pra ir pra outras cidades. Adorei a oportunidade de ir e vir, a pé, a qualquer hora do dia e da noite, sozinha ou não, sem medo de ser assaltada ou coisa pior. Gostei de pertencer a um grupo com pessoas de diversos lugares do mundo e que, por incrível que pareça, se entendiam muito bem e tinham muita curiosidade de aprender umas com as outras. Amei aprender algo novo a cada dia. Sair de casa sem destino definido e voltar de madrugada, depois do dia mais divertido da minha vida, que na verdade foram diaS, muitos deles.
Tem gente que pira quando vai embora. Conheço gente que ficou poucas semanas e não aguentou (uma patricinha irritante, de Milão, que achou a cidade pequena demais). No meu caso, não tive problema algum com isso, pelo contrário. Pode ter sido sorte, sei lá, mas me identifiquei com muita facilidade à nova vida. Coisa que eu tento fazer há 21 anos aqui e não consigo. O que as pessoas esperam que eu faça, esperam que eu goste, enfim, o que as pessoas esperam uma das outras aqui, geralmente, não é nada do que eu sou de fato. Por isso eu sou tão diferente das minhas amigas daqui, talvez. Da minha mãe até. Lá, eu era estrangeira, mas me sentia, às vezes, mais confortável do que aqui.
E esse é o lado monstrinha da história: foi muito mais fácil ir embora do que voltar. Eu não queria assumir isso pra mim mesma, porque é óbvio que eu amo minha família, meus amigos e várias pessoas que eu deixei aqui e que são muito especiais pra mim. Mas eu não gosto dessa cidade, dos costumes daqui, do ritmo de vida, de ter que pegar carro/ônibus pra ir pros lugares, de ter que pagar flanelinha pra estacionar na rua (isso não existe lá, e eu sei que tem todo um fundo de questões sociais, etc etc, mas isso me irrita e ponto final). Não gosto das pessoas te analisando de cima em baixo, focadas nas coisas mais fúteis do mundo. Lá tava todo mundo pouco se lixando pro modo como você se veste ou não, se maqueia ou não (aliás, se você se maqueia muito lá e pinta suas unhas de laranja, as pessoas não vão achar normal, mas não vão falar nada, muito menos tentar fazer você mudar seu jeito - individualidade, eu gostei muito disso). Lá ninguém é amigo de ninguém de uma hora pra outra, mas se se tornam amigos, são amigos de verdade, que gostam de você pelo que conhecem de você, e não pelo modo como você sai na rua. Os relacionamentos lá te sugam menos. Podem parecer mais frios do que os daqui, mas eu enxerguei pelo lado positivo: você tem espaço pra você mesmo e dificilmente você frustra alguém, porque as pessoas não depositam toda a esperança do mundo em você.
Mas talvez a minha birra principal seja com Goiânia mesmo. Podem jogar o tijolo, mas eu, que morei em uma cidadezinha de 14 mil habitantes lá, acho Goiânia muito mais provinciana, principalmente por causa da mentalidade do povo. Óbvio que tem exceções , mas no geral é essa a minha impressão. Eu gostava mesmo do estilo de vida que eu tinha lá.
Outra coisa que pesa é que tudo em um intercâmbio é novidade. Quando você volta, volta m também a rotina, as obrigações , as cobranças. A vida real, hehe.
Mas o pior mesmo é deixar as amizades que você fez pra trás, sem nenhuma garantia de que, um dia, vai voltar a vê-las. Ainda bem que existe a tecnologia pra aliviar, mas não é a mesma coisa.
Ana, foi só um ano. O que é um ano perto das amizades que você fez aqui durante a vida, perto da sua família? Aí é que essa coisa de marcar o tempo se revela mesmo uma criação humana pra necessidade de organizar-se e nada mais. A intensidade das amizades ali é outra. Fui sozinha, sem conhecer ninguém, e voltei me sentindo amada e amando muito. Recebi apoio de gente que eu conhecia a 4 meses, gente que cuidou de mim como se fosse minha família. De certo modo, naquela situação, eram. E eu não sei se voltarei a ver essas pessoas. A abraçá-las. Isso é o mais difícil de aceitar, de engolir. Não quero menosprezar quem eu amo aqui, mas é apavorante pensar que posso nunca mais voltar a ver quem eu amo e que está(o) lá. E essa sensação de pavor anula um pouco a alegria que eu pensei que fosse sentir ao voltar.
A vontade que dá é mesmo de ser duas ao mesmo tempo. São duas vidas, duas Anas. E parece que eu me identificava mais com a Ana de lá, o que faz de mim, aos olhos de muitos aqui, um monstrinho sem coração. Mas na verdade, tem um coração enorme aqui, apertadinho que só, de saudade do que foi muito bom. Nada mais natural.

ps: como se nao bastasse, passei o reveillon ano passado em Londres, com direito a neve pós meia noite. Esse ano vou passar em Goiânia. Sehr gut. #nicht

Felicidade/Fröhlichkeit

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Manchmal schreibe ich

Intercâmbio concluído (o que ainda não superei muito bem, mesmo quatro meses depois), monografia feita e defendida, graduação em jornalismo completa. Fiz muita coisa nesses últimos meses, e por isso deixei o blog um pouco de lado. Mas isso, a partir de agora, vai mudar. Se tudo der certo, as postagens serão semanais, ou quinzenais. O nome do blog é às vezes eu escrevo e não “de vez em nunca eu escrevo”.
Falando no nome do blog, há algo a esclarecer. Um comentário anônimo no post anterior, nada sutil, me “informou” que o nome estava errado. De fato o nome (manchmalichschreibe) estava gramaticalmente errado. O certo seria como está no título deste post. Manchmal significa "às vezes" schreibe significa “escrevo” e ich é o pronome "eu". ÀS VEZES ESCREVO EU. Sim, é assim que nossos “brüders” escrevem – e antes que apontem meu erro novamente, esclareço que sei que o plural de irmãos é Brüder, mas quis aportuguesar o verbo. Licença poética, ok?
A regrinha é a seguinte: o verbo fica, na imensa maioria dos casos, na segunda posição da frase. Como eu coloquei a locução adverbial de tempo antes, o verbo vem em seguida, e o pronome, por último. Essa regrinha e outras mais da difícil porém encantadora língua alemã são difíceis de se acostumar. Daí que quando criei o blog, ainda no Brasil, isso não tinha entrado na minha cabeça e o nome saiu errado. Percebi alguns dias depois de chegar na Alemanha. A overdose de alemão me fez, logo na primeira semana, me acostumar e familiarizar com a lógica (?) da língua e parar de cometer o erro mais comum de todo aprendiz de alemão: querer traduzir do português para o alemão, palavra por palavra. É erro na certa.
A ordem das palavras nas sentenças em alemão é outra. Em alguns casos, nas frases chamadas de “nebensatz” (algo como frases subordinadas), o verbo vai lá pro final.
Exemplo:

Ich möchte nun sagen, dass ich dich so sehr vermisse.
Eu queria apenas dizer que sinto muito sua falta.

A tradução, palavrinha por palavrinha, fica assim:

Eu queria apenas dizer, que eu te tanto sua falta sinto.

Bom né? Quando a frase é longa, a tortura é maior. Você tem que esperar até o último segundo pra saber o que aconteceu, algo como: Ontem de noite eu com meu namorado ao shopping perto do Vaca Brava comer fui. (!!)
Lógica, pensava eu, era algo que não se discutia. Engano o meu. A lógica dos alemães é bem diferente da nossa (aqui vem as piadinhas sobre alemães e seus leves excessos na cerveja...). Nos números isso também é perceptível. 32 não é trinta e dois. É dois e trinta. Se fosse trinta e dois, seria dreizigundzwei, mas não é, é zweiunddreizig. E é tudo junto mesmo, como em Einkaufswagen – compras de carrinho, ops, carrinho de compras.
Eu, como mera mortal e aprendiz de alemão que sou, ao fazer meu blog antes mesmo de ir pra lá, cometi esse errinho. Hoje algo assim jamais me passaria despercebido, e eu acho isso bacana! Significa que meu ano por lá rendeu bastante, não apenas em termos de diversão e conhecimento de culturas e lugares novos, mas também no aprendizado de uma língua considerada difícil por nós, falantes de línguas oriundas do latim. A sensação de perceber que meu alemão evoluiu muito é ótima, mas eu não vou negar meu passado de errinhos básicos como esse e, ao olhar o erro na minha URL, meu orgulho só cresce. Eu não tive preguiça nem medo de encarar esse desafio. Me joguei mesmo. E foi, até hoje, a melhor coisa que fiz na vida.
Arrumei o nome não por vergonha do meu erro, mas porque não quero que eventuais aprendizes de alemão entrem aqui e aprendam algo errado. Mas que atire a primeira pedra quem fez alemão e não trocou a ordem das palavras nenhuma vez. Aqui fica a minha dica: alemão pode ser difícil no início, mas depois que você pega o jeito (de preferência indo pra lá, se você tiver condições), cada aprendizado é uma vitória e a sensação de dominar uma língua complicadinha dessas é uma delícia! Eu simplesmente viciei! Ou seria simplesmente viciei eu?

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Berlim

Me matriculei na matéria 'Berlim como cenário da História Alema', só por causa da observacao em destaque: Excursao para Berlim. Para garantir minha vaga na viagem tive que apresentar um seminário em alemao sobre os Judeus na época da República de Weimar (1919 até 1933). Foi um dos melhores negócios da minha vida. Paguei só as passagens de trem, 108€ ida e volta. Hospedagem com café da manha em um albergue bacana e bem localizado e entrada nos museus a serem visitados saíram de graca. A viagem de Eichstätt a Berlim durou pouco mais de 6 horas (pagando mais caro e pegando um ICE, um trem direto, pode durar 2 horas), nas quais eu dormi, observei a paisagem e li 'Mundo Sustentável', do André Trigueiro. Chegando no albergue, fomos avisados: café da manha às 7, todos prontos na porta do albergue às 8. Fazia muito tempo que eu nao acordava tao cedo. O café da manha no St. Elisabeth Herberg foi bem reforcado. Os tickets de 3 dias de metrô divididos em grupos de 5 pessoas custaram 9€. Realmente barato ir pra Berlim em grupo. Os tickets individuais diários custam 6,20€ e os de uma viagem apenas custam 2,20€.

Preussiches Geheimes Staatsarchiv

O prédio dos arquivos secretos da Alemanha foi o nosso primeiro destino. Lá estao arquivados documentos, cartas, mapas e mais uma infinidade de coisas 'secretas' e antigas, muito antigas. Na sala de conferências, depois de uma breve explicacao de um senhor que trabalha no local, tivemos acesso a alguns cadernos de cartas. Alguns documentos datavam de 1725! Eram cartas entre reis e seus filhos, ou soldados e suas esposas, em sua maioria. Muitas escritas em um misto de francês com alemao antigo, devido à organizacao político-geográfica na época dos impérios na Europa e etc (confesso que nao sei muito sobre isso). Além de ter contato com os documentos originais, pudemos ver nos laboratórios como é o trabalho de restauracao dos documentos mais antigos. Um trabalho extremamente cuidadoso, que exige muita paciência, habilidade e saúde de ferro. O cheiro de mofo no ar é terrível. Pesquisadores têm acesso à uma biblioteca privada. Passamos por lá e me surpreendi com a quantidade de pessoas pesquisando os documentos antigos, fazendo anotacoes. O senhor que trabalhava lá explicou que, em sua maioria, os pesquisadores estao ali atrás de dados para escrever livros de História. Achei o máximo.

Wansee Konferenz

Praticamente atravessamos a cidade de metrô e ônibus para chegar ao casarao aonde foi realizada a Wansee Konferenz, à beira de um lago enorme, longe do centro da cidade, em um bairro nobre de Berlim.

Steffi, eu e Wansee ao fundo

Como já estávamos com o cronograma atrasado, nao paramos pra almocar. Um Döner Kebap, sanduíche típico turco muito vendido na Alemanha deu conta da minha fome.

Curtindo um Döner Kebap nos jardins do Memorial da Conferência de Wansee

Uma doutoranda em História da 2a Guerra Mundial foi a nossa guia. A Conferência de Wansee foi uma reuniao entre os cabecas do regime nazista para decidir o que fazer com a quantidade enorme de pessoas espalhadas nos campos de concentracao. Foi ali que decidiram pelo extermínio de muitas delas. Na realidade, os assassinatos e maus tratos já estavam acontecendo antes. A conferência de Wansee foi apenas a 'formalizacao' do Holocausto entre os próprios nazistas. Claro que nada do que foi decidido ali foi extendido para o resto da populacao alema, levada a acreditar, por meio da massiva propaganda nazista, que os campos de concentracao eram campos de trabalho aonde os prisioneiros eram bem tratados... A fachada do casarao estava em reforma, mas ainda assim era possível notar sua grandiosidade. A beleza dos jardins e da vista do lago, nos fundos da casa, nada remetem à gravidade do que foi ali decidido e oficializado. Em um dos intervalos entre o tour com a guia e algumas apresentacoes de seminários, demos uma escapulida pra um barzinho no píer do lado, nas proximidades da casa. Foi ali que experimentei a Berliner Weissen Himbeere. Sim, essa bebida rosa é uma cerveja de frutas vermelhas, nao um coquetel. Uma delícia.


Tour tradicional

Como anoitece tarde no verao em Berlim (por volta das 9 da noite), depois de encerradas as atividades acadêmicas, aproveitei pra ir conhecer os pontos turísticos tradicionais. Eu e uma alema que se chama Steffi pegamos o metrô e descemos na Potsdamer Platz, onde fica alguns parcos pedacos do que sobrou da estrutura do Muro de Berlim.

Pedacinho do Muro de Berlim exposto na Potsdamer Platz

Seguimos a pé mesmo para o portao de Brandenburgo, que é aonde realmente ficava o muro.


Ao lado fica o memorial dos Judeus, um labirinto enorme representando as vítimas do Holocausto.

Ali na mesma regiao do Portao de Brandenburgo, que divide a Alemanha Oriental da Ocidental, também fica o Reichestag, ou Parlamento Alemao.

E de frente pra tudo isso, tem um parque muito lindo. De lá demos uma caminhada mais prolongada e chegamos à Alexanderplatz, onde fica o Relógio Mundial.

Os principais pontos turísticos de Berlim nao sao muito longe uns dos outros. Dá pra ver tudo em duas horas, a pé. Bom, pelo menos eu e a Steffi conseguimos a proeza.

Gedenkstätte Stasi

Sexta feira, primeiro destino. O memorial dos Stasis fica em um prédio que fazia parte do aglomerado de escritórios da Gestapo, a polícia da DDR (Deutsche Demokratische Republik), ou Alemanha Oriental (Sachsen, Sachsen-Anhalt, Thüringen, Brandenburg, metade de Berlim e Mecklenburg-Vorpommern eram os Estados da DDR).

Bandeira da DDR na porta do Museu dos Stasis

Os policiais eram chamados de Stasis. O regime socialista da Alemanha ficou conhecido pelo excesso de vigilância. Haviam muitos policiais que trabalhavam oficialmente para o Estado, mas haviam também inúmeros cidadaos que trabalhavam à paisana e mantinham segredo em relacao à sua ligacao com o aparato de vigilância estatal. Por isso, na época, existia uma espécie de código de conduta nao oficial. Mesmo perto de melhores amigos ou até familiares, nao se criticava abertamente o regime. Qualquer um podia ser um Stasi, ou poderia ser surpreendido por um. Como a política era 'de seguranca máxima', a Gestapo nao economizou no uso de tecnologias que se popularizaram com os filmes do James Bond. Câmeras secretas em troncos de árvores, canetas, bolsas.

Câmaras especiais noturnas no lado interno da porta de carros, capazes de filmar através do capô. Todos se sentiam vigiados o tempo todo, e pelo que vi no memorial, realmente eram.

Nossa guia foi uma mulher que cresceu na DDR. Ela nao tinha nada contra o regime, cresceu 'acostumada', até que um dia resolveu fazer, com amigos de escola, uma demonstracao na rua de como se recicla papel. Durante a demonstracao, percebeu que um homem os filmava, mas nao ligou. Meses depois um amigo perguntou se ela havia recebido uma carta que ele havia mandado. Ela desconfiou do fato de nao tê-la recebido e comprovou: a Gestapo estava controlando a correspondência dela, assim como fazia com a de inúmeros outros cidadaos da DDR. A partir daí é que ela sentiu o impacto do lado negativo da vida na DDR.

DDR Museum

Ainda focados na Alemanha Oriental, fomos para o Museu da DDR, que fica bem ao lado da Catedral de Berlim, às margens do Rio Spree. Por ser particular, o museu tem uma proposta bem diferente e interessante: 'história para tocar' é o que está escrito no flyer. Tudo no museu é interativo. Tudo tem ares de jogo, de brincadeira. E o foco da exposicao é a vida cotidiana na DDR. Um Trabant, carro mais vendido na época – e que exigia filas de espera de mais de15 anos, por causa da baixa producao e dos boicotes internacionais ao regime social alemao – fica bem na entrada do Museu, à disposicao dos visitantes que podem entrar no carro e observar seu curioso – e pequeno – interior.


Trabant, o carro da DDR

É um museu interativo e muito divertido. Na sala de TV de uma típica família da DDR, atrás do quadro, um microfone grava, para a Gestapo, a conversa que deveria ser privada.

Atrás do quadro, um microfone grava a conversa da família na DDR

Na estante em cima da TV preto e branca, uma prateleira com livros sobre educacao sexual, assunto que era tratado com muita abertura pelas famílias que viviam sob o regime e era matéria escolar desde a infância. No telefone, um alemao todo feliz revela 'estou ligando para avisar que, finalmente, consegui uma linha telefônica...' No banheiro, nao raro, faltava papel higiênico. Em uma parte do museu com vários aparelhos fonográficos e fones de ouvido, é possível ouvir trechos de gravacoes reais feitas por Stasis, assim como a programacao da rádio jovem da DDR, já que músicas do lado Leste era proibidas. A falta de bens de consumo e a constante vigilância existiam, mas paralelo à isso, existia também a vida cotidiana. E é esse o foco principal do museu, no qual eu poderia ter passado toda uma tarde, tranquila, sem me cansar. Realmente muito divertido e ilustrativo.

Deutsches Historisches Museum

Nao posso falar o mesmo do DHM, o museu da História Alema. Ele é enorme, ilustra a história da Alemanha desde os primeiros moradores da regiao de que se tem notícia, os Célticos.

Máscara usada na época das pestes na Europa

O precursor das BMW's e Audis da vida

Mas é tanta coisa, tanto quadro, tanto texto pra ler e tao pouca interatividade que cansa. É como o Louvre. É bacana no início, mas depois de um tempo fica um saco. Mesmice. Talvez a falta de um guia seja um pouco responsável por isso, nao sei. Mas foi o lugar de toda a viagem que eu menos gostei, e poderia muito bem ter passado sem. A única coisa que salva é a sala de cinema, que roda um documentário interessante sobre a, adivinhe só, 2a Guerra Mundial. A entrada custa 5€, mas fique esperto: eles dao um adesivo pra colocar na roupa, que você pode encontrar no chao, na entrada do Museu, ou mesmo pedir pra algum alemao ou turista te dar ou vender mais barato depois de ter feito a visita. É um controle bem precário. E eu só tô dando a dica porque, pra mim, nao valeu os 5€. (e foi a única exposicao em que tivemos de pagar pra entrar).


Topographie des Terrors


Pra fechar o dia mais corrido e cansativo da excursao, ainda fomos à exposicao Topografia do Terror. Recém inaugurada (em maio desse ano), antes era apenas uma pequena exposicao de fotos e textos, na rua, ao longo do que sobrou do muro original de Berlim, mas em uma parte mais afastada da cidade. Agora, com uma sede muito bem construída, a exposicao ficou maior, mas segue o mesmo estilo fotos, documentos e textos. O foco é, também, a 2a Guerra Mundial. Bem interessante, prática e direta. Vale a pena também pra ver um pouco mais do Muro, porque o que está exposto na Potsdamer Platz é um pedaco bem pequeno do muro mesmo.

Documento secreto que contabilizava o número de mortos em campo de concentracao

Procurados depois da queda do Nazismo

Um pedaco do muro original

Restaurante Brasileiro

Novamente, eu e Steffi animamos, mesmo cansadas e com os pés doendo de tanto andar (leve um tênis bastante confortável se for a Berlim), de ir em um restaurante brasileiro. Ela por curiosidade, eu por saudade. Primeiro erramos de endereco. Confundimos o nome de duas ruas, Kurfürstendammstraße com Kurfürtenstraße – sacanagem hein? A primeira era o local certo, a segunda era uma regiao duvidosa, zona de prostituicao e uns tipos que, sem sobra de dúvidas, se nao eram traficantes, eram cafetoes. Só foi bacana ir até lá pq, na ida, a pé, passamos por onde é realizada a Berlinale (Festival de Cinema Alemao) e em frente à Legoland.

Girafa gigante em frente à Legoland

Enfim, ao notar o erro, tratamos de pegar o metrô correndo. Depois ainda tivemos que pegar um ônibus. Morrendo de fome, chegamos ao tal restaurante. Dois caras lutavam capoeira em frente ao buffet self service, e Ivete Sangalo tocava na maior altura. Parecia uma festa. Quase nao tinha mesa. Ok, nem ficamos. Pagar 25€ por um rodízio de carne nao dá. Meu desespero nao é tanto assim, ainda aguento um mês. Acabamos comendo em um Mexicano, muito mais barato, perto da Potsdamer Platz.

Restaurante Brasileiro: 25€ o rodízio. Só passei na porta e tirei a foto.

Jüdisches Museum


No nosso último dia em Berlim, visitamos o Museu dos Judeus. A arquitetura do museu foi o primeiro ponto de explicacao do guia que nos acompanhou. Na parte mais moderna do museu, três corredores se cruzam. Cada um representa uma coisa diferente. O corredor da Continuidade, mais neutro, cruza os demais, representando os Judeus que conseguirem sobreviver após o Holocausto. O Corredor do Exílio comeca pequeno, estreito, em uma parede preta. Acaba com uma saída para o jardim, por onde entra a luz do sol. Ele vai se tornando mais amplo e, nas paredes, estao escritos os nomes das principais cidades onde os judeus alemaes buscaram exílio. Rio de Janeiro é uma delas.

O Corredor do Holocausto é estreito, com paredes negras no início e no fim, sem saída. Vai se tornando cada vez mais estreito e asfixiante. Vitrines dos dois lados mostram fotos e documentos de judeus vítimas do Holocausto. Aí fomos levados à exposicao permanente, que deixa um pouco de lado a questao do Holocausto e aborda o tem 'Judeus' de forma mais ampla, e por isso mesmo mais interessante. Mostra como, por exemplo, os judeus sao pioneiros em muitos negócios. Eles criaram, por exemplo, as Kaufhäuser, que sao tipo lojas de departamento enormes, que vendem nao apenas roupa, mas também comida, móveis, acessórios para casa, etc. Sao bem populares aqui na Europa. Nao apenas no campo do comércio, mas também das ciências os judeus se destacaram bastante, desde antes da 2a Guerra. Até entao, já haviam ganhado 7 Prêmios Nobel, o mais famoso deles conquistado por Albert Einstein pela sua teoria da Relatividade. O primeiro médico/psicólogo/cientista a se dedicar ao estudo do sexualismo, do homossexualismo e dos hermafroditas era um Judeu: Magnus Hirschfeld. Outros exemplos se seguem, com fotos, textos e objetos interativos. É um museu, como o da DDR, que nao cansa.
A maior surpresa veio, no entanto, na exposicao temporária. Você sabia que Batman, Huck, Capitao América e Super Homem sao quadrinhos criados por Judeus na década de 30 justamente para combater o Nazismo? Na exposicao, a capa dos primeiros números dessas revistas mostra Hitler ou soldados nazistas sendo combatidos por esses super heróis. Achei isso o máximo!

Capas de Batman e Super Homem contra o regime Nazista

Na entrada do Museu com os dizeres 'Até heróis têm seus dias ruins'

Gedenkstätte deutscher Widerstand

Claro que durante o Nazismo nem todo mundo esteve de acordo com as ideias do Regime. Aliás, grande maioria nao estava de acordo, mas nao havia liberdade para se pronunciar contra. Quem o fazia, geralmente, pagava com a própria vida pela 'rebeldia'. Ainda assim, muitos o fizeram. E para conhecer a história dos que se rebelaram contra o regime nazista fomos ao Memorial da Resistência Alema, que fica na casa aonde foi elaborada a Operacao Valquíria, uma tentativa frustrada de atentado ao Hitler, feita por soldados nazistas rebeldes. http://www.youtube.com/watch?v=Xj8W7SlWVLs

Na mesma casa o general Olbricht e mais alguns parceiros do plano foram executados.

Na parede do jardim do memorial, placa em homenagem aos generais executados

Fotos, citacoes e textos fazem parte da exposical permanente, que conta a história nao apenas dessa operacao, mas de várias tentativas, algumas até de anônimos, de derrubar o regime ou meramente criticá-lo. A história de Anne Frank, a menina judia que escreveu um diário no campo de concentracao, também é abordada.

A última noite em Berlim

Fim das visitas a museus e memoriais, fomos aproveitar a última noite em Berlim. Queria ter ido em alguma balada, mas meu pé, maltratado pelo meu tênis, me impediu. Ia rolar uma ópera ao ar livre, em frente à Universidade Humboldt, ao lado da Ópera de Berlim. Evento realizado pela Universidade e patrocinado pela BMW. Fomos conferir.

Bem bacana mesmo a iniciativa. Encontramos os docentes responsáveis pela excursao, e fomos com mais um pequeno grupo comer em um restaurante ali do lado, com precos bem elevados, por sinal (é uma regiao nobre da cidade). Fiquei só na bebida mesmo, e na primeira oportunidade, dei uma escapulida com a Steffi e fomos experimentar a Berliner Currywurst em um quiosque próximo.

Comendo uma Berliner Currywurst

Na Alemanha, cada cidade grande tem seu tipo próprio de salsicha (assim como de cerveja). Em Berlim, ela vem com molho Curry, um pouco apimentado, mas muito bom. Adorei. Mas minha preferida continua sendo a Nürnberger Weisswurst, salsicha branca de Nuremberg. De-li-ci-nha. Depois animamos de andar um pouco (ai, meu pé). Seguimos pela beira do rio que corta a cidade, e próximo ao Bode Museum achamos um barzinho/praia bacana, mas muito lotado.

Andamos um pouco mais, mas muitos barzinhos já estavam fechando, o que eu estranhei, porque ainda era meia noite. Nos sentamos em um restaurante. Uma caipirinha custava 8€. Se eu achava os 4,50€ de Eichstätt um absurdo, imagina pagar 8€, cerca de R$18,00 em uma capirinha? Não dá né? Fiquei no suco de cereja, e, no final, pra surpresa de todo mundo, o professor pagou a conta toda. Obrigada, muito obrigada.

Fotos Extras

Ampelman, o homenzinho do semáforo da Alemanha Oriental

Urso, um dos símbolos da cidade

Catedral de Berlim

Soltando a voz e sendo feliz em frente à Ópera de Berlim

domingo, 4 de julho de 2010

A festa da Alemanha

Nessa Copa senti um misto de emocoes inexplicável. Como havia dito no post anterior, assistir a Copa fora do país é muito estranho. No início fiquei muito feliz com as vitórias da Alemanha. Aí fiquei com medo e comecei a torcer contra, até porque todo mundo aqui torce contra o Brasil, tirando os amigos que, se torcem contra, escondem o fato pelo bem da amizade, hehe. Aí o Brasil caiu fora. Caiu fora porque perdeu pra Holanda, rival da Alemanha, assim como a Argentina é rival do Brasil. Apavorei pensando que iam curtir demais comigo aqui. Nao curtiram. Foram de um respeito enorme, e até disseram que sentiam muito, porque achavam que o Brasil merecia ir mais longe (mas claro que o título, quem merece, somos nós - emendaram). Pois bem, gostei do respeito deles e resolvi torcer por eles de novo. Ainda mais no jogo contra a Argentina, digamos que nao foi lá muito difícil. Mas agora, minhas raízes sul americanas estao pulsando nas minhas veias, e peguei um amor no Uruguai que eu nunca tive. Entao, qualquer um desses que ganhar, vou ficar feliz. Caso a Alemanha ganhe, provavelmente, vou ficar bêbada, porque a festa aqui promete ser bruta!
As festas alemas sao muito curiosas. No dia a dia, eles sao sim um povo fechado, sério, sisudo. Aí nas festas, acho que pra descarregar as tensoes, eles ficam loucos. Literalmente loucos.
Bom, voltando à Copa, aqui vao algumas fotos da comemoracao de ontem, tiradas por Hóngjiā Qī, chinês que estuda aqui em Eichstätt comigo e tem TODOS OS DIREITOS DAS FOTOS RESERVADOS, que fique claro.










Eles têm até uma música, que fala dos anos que a Alemanha venceu as 3 Copas, e acrescenta o ano atual. A música existe desde 2006.. aí adaptaram pra Copa desse ano. Será que eles vao poder mesmo cantá-la dia 11 de julho?
Clique no título da música para ouví-la e acompanhe a traducao da letra (lembrando que números em alemao sao ditos pelo contrário, eles nao falam cinquenta e quatro, e sim quatro e cinquenta, por isso a música deu certo, haha):

Sportfreunde Stille

1 e 2 e 3 e 54, 74, 90, 2010
Sim, cantamos todos juntos!
Com o coração na mão e a paixão nas pernas
Nós seremos campeões do mundo!

Nós não temos a melhor cultura de jogo
E também não somos filigranas (?)
Mas nós temos sonhos e visões
E nos bastidores um grande plano.
E para nosso longo caminho para fora da crise
E da depressão
Diz o lema: nada como estar no trono do futebol!

1 e 2 e 3 e 54, 74, 90, 2010
Sim, cantamos todos juntos,
Com o coração na mão e a paixão nas pernas
Nós seremos campeões do mundo!

O mundo inteiro tenta alcançar a taça de ouro
Mas só um a segura de verdade.
Então agora é o momento.
O mundo todo tenta.
Mas a copa continua na nossa terra! (resquício da música em 2006)

1 e 2 e 3 e 54, 74, 90, 2010
Sim, cantamos todos juntos,
Com o coração na mão e a paixão nas pernas
Nós seremos campeões do mundo!

Na primeira vez foi um milagre
Na segunda foi sorte
Na terceira ganhamos a recompensa
E dessa vez vai ser sensacional!

1 e 2 e 3 e 54, 74, 90, 2010
Sim, cantamos todos juntos,
Com o coração na mão e a paixão nas pernas
Nós seremos campeões do mundo!

54, 74, 90, 2010
Nós já temos todos esses com certeza,
Com o coração na mão e a paixão nas pernas
Nós seremos campeões do mundo!