A sua pressa
não vai acelerar o ritmo das coisas. Essa afirmação caberia a temas diversos da
vida, inclusive aos mais profundos e íntimos. Porém, estes não são os objetos
de análise deste texto. Escrevo sobre algo aparentemente banal, mas que revela
uma possível tendência do comportamento humano, afinal, é nas ações, e não nas
orações, que se percebe o que alguém de fato é.
Então vamos
aos fatos: sua pressa não vai fazer a porta do avião abrir mais rápido nem o
avião decolar antes do horário. Ah, é esse o tema? É. Desculpa se desapontei,
mas é isso. Em 2013 quis o destino que eu viajasse muito mais de avião do que
estava acostumada – o destino e as promoções de passagens aéreas, que
possibilitaram isso. Quase todos os meses, a partir de julho, embarquei para o
ensolarado Rio de Janeiro, em escalas por São Paulo ou Brasília. Em todas as
ocasiões pude observar um comportamento que me intriga e muito.
Determinado o
portão de embarque, todos se sentam ao seu redor, esperando o chamado. Mas,
antes mesmo dele, alguns já insistem em fazer fila no portão. “Pedimos aos
clientes do vôo 000 com destino à Felicidade para que aguardem sentados na sala
e dirijam-se ao portão de embarque quando forem chamados”. Parece que aquelas
pessoas em pé, na fila, têm algum problema de audição e ignoram o aviso. Ou
gostam de se cansar – cada um gosta do que quiser.
Proceed to
Gate aparece na tela acima do portão de embarque. Muitos não percebem que
aquilo significa “encaminhe-se ao portão de embarque” e que o fato de estar
sentado próximo a ele já é suficiente. A grande maioria se levanta e vai se
juntar aos que formavam a pequena fila inicialmente. Forma-se um corredor de
humanos e suas bagagens de mão. Continuo sentada, observando. Todos parecem
entediados naquela fila, sem perceber que a opção de estar ali é deles mesmos.
Alguns minutos
depois, inicia-se o embarque. “Prioridades garantidas por lei, idosos, portadores
de necessidades especiais, gestantes, adultos com crianças de colo (...)
clientes gold, platinum (...)” e uma infinidade de gente que não se enquadra
nestes quesitos continua enfileirada com cara de tédio – alguns tentam passar
na frente mesmo sem ter esse direito e são convidados a voltar, revoltados,
para a fila.
Fila - o embarque nem tinha começado
Em seguida
inicia-se o embarque dos mortais pelo grupo 1. Grupo 1 é quem senta na
janelinha, sempre o meu caso. Quando os primeiros entram, me levanto calmamente
e me aproximo do portão. Alguns me olham torto e um até chegou a comentar “olha
a fila”. Qual seu grupo? – respondo. “2”, ele responde. Pois é, sou do grupo 1.
Minha vontade é mandar um beijinho no ombro, mas opto por virar pra frente e
seguir. Às vezes encontro um insistente de um grupo 3 que precisa se levantar
para que eu passe e sente na minha janelinha. É, a divisão por grupos existe
por um motivo: evitar que uns se levantem pra outros se sentarem e tumultuar
ainda mais o corredor do avião, já abarrotado de gente colocando suas bagagens
no compartimento próprio a isso (vale lembrar que dá pra colocar embaixo da
poltrona da frente também, mas isso é assunto pra outro post).
Sento-me,
afivelo meu cinto, desligo o celular. A garota ao lado joga Candy Crush.
Fecham-se as portas e o rapaz que fora um dos primeiros a ir pra fila de
embarque foi um dos últimos a embarcar. Devia ser do grupo 3. Ficou quase meia
hora em pé, a toa. Os comissários pedem pra desligar o celular, aviso que a
menina do Candy Crush finge não escutar até que uma aeromoça simpática pede
para ela fazê-lo. Neste momento vejo na aeromoça a figura de uma babá cuidando
de adultos que deveriam saber que as orientações estão ali por algum motivo.
Sinal da cruz na
partida, durmo feito criança com o barulho contínuo da turbina, sinal da cruz
na descida. Mal o avião pousa e os afoitos já tiram os cintos e começam a se
levantar. O chefe de comissários avisa que ainda é pra sentar e afivelar os
cintos. O avião pára (permitam-me usar esse acento até 2016, obrigada). Todos
se levantam e competem para ver quem pega a bagagem de mão primeiro. Continuo
sentada, observando. O corredor está tomado de gente em pé, com cara de
cansaço, reclamando da demora.
Fila - o avião mal tinha pousado
Não adianta, meus caros. Há todo um procedimento para que a porta do avião se abra. Não é um carro nem um ônibus. Exige mais logística que isso. Ainda é preciso saber onde se pegará a bagagem. Enfim, não é a sua pressa que vai fazer o processo acelerar. As coisas são assim, fim. Começam a andar, pego minha mochila estrategicamente colocada debaixo do banco da frente, o que me poupa alguns segundos, e já saio andando assim que me levanto, poupando minhas pernas da fadiga evitável e pensando: aonde as pessoas querem chegar com toda essa pressa? Não adianta, meus caros. Poupem suas pernas também.
Um comentário:
É a velha necessidade do brasileiro de querer 'se dar bem'. Às vezes (ou muitas vezes, ou na maioria das vezes) vira estupidez.
Postar um comentário