Antes de ir embora...

Daqui 12 horas estarei a caminho do aeroporto de Goiânia. Escalas em Guarulhos, em Milão e chegada em Munique. Depois pego trem, ou ônibus, pra Eichstätt. Mas antes disso tenho que falar justamente sobre o antes. Não vou insistir no óbvio, já estou com o peito apertado de deixar pai, mãe, namorado, amigos para trás. Nào é fácil, mas não quero falar sobre isso porque é uma sensação que não se explica. Eu estou triste mas estou alegre e excitada (nada de duplo sentido, por favor), e não dá pra explicar isso.
Quero falar sobre sentimentos, mas não esses. Quero falar mais precisamente de sentimentalismos. Coisas que vêm à tona quase sempre apenas em situações extremas, como essa, de uma experiência de um ano fora do seu país e do convívio dos seus.
Quando o fatídico 14 de setembro foi chegando, as pessoas foram se abrindo comigo. Começaram gradativamente a me procurar mais, a querer me ver mais, e a demonstrar mais os sentimentos. Não que não demonstrem no dia a dia... afinal, quantas vezes recebi ligações surpresas da Ana Paula, da Camila pra contar as loucuras, da Bruna pra perguntar como estou depois de alguns dias afastadas? Quantas vezes eu indaguei que queria comer batata frita e, no outro dia, minha mãe pediu pra Dina fazer e ela fez? Quantas vezes meu pai assumiu que eu sou a filha querida na frente dos meus irmãos? Quantas vezes meu querido ficou em silêncio, só olhando pra mim, com olhos que dizem mais do que qualquer palavra? Quantas vezes meus colegas de trabalho me cumprimentaram com um sorriso enorme, mesmo correndo que nem loucos pra terminar de fechar o programa? Eu percebo, nas atitudes do dia a dia, o sentimento das pessoas por mim. Mas nem sempre é nítido. E agora é.
Recebi cartas que falam de uma Ana que nem eu mesma sabia que era querida e admirada assim. Que era vista como uma menina corajosa. Como uma irmã. Cozinharam batata pra mim, fizeram torta de chocolate pra mim, espremeram seus horários pra me ver, me chamaram pra mais programas, fizeram uma festa surpresa pra mim, e cada amigo escreveu seus votos de felicidade em um cartaz que dizia "nós te amamos" em alemão. Começaram a lembrar de coisas que aconteceram há anos, felizes ou não. Isso me remeteu um pouco ao que acontece quando alguém falece, mas com duas importantes diferenças: estou viva, e estou sendo celebrada justamente por estar VIVENDO. (Agradeço a Deus e a meus pais por ter essa oportunidade). E tenho o privilégio de sentir o carinho, não apenas nas pequenas coisas diárias, mas em palavras bem claras e explícitas.
Me pergunto: por que só demonstrar o quanto alguém é especial e querido apenas em situações como essa? Por que nos tornamos frios a ponto de achar que é piegas demonstrar amor por quem faz por merecer esse amor, por pessoas sem as quais não seríamos o que somos?
As cartas que recebi e as demonstrações de carinho, por mais singelas, me deram uma alegria enorme, me fizeram me sentir importante e querida pra muita gente, e a minha vontade agora é de que todas essas pessoas (e por quê não todas as pessoas?) também sintam isso: o sabor do reconhecimento, do amor, da amizade, do cuidado, do carinho.
Atitudes do dia a dia falam alto, mas demonstrações explícitas também fazem muito bem à saúde. Pratique.

ps: espero que eu tenha deixado claro, pra cada um dos meus amigos, o quanto eles também são especiais pra mim.